BELA TERRA: Obra audiovisual que versa sobre a ocupação norte americana em Belterra-PA
RESUMO: O presente trabalho apresenta a obra audiovisual Bela Terra como resultado da pesquisa e experimentação artística do projeto de iniciação científica PIBIC/Universidade de Brasília. A pesquisa utiliza ferramentas de debates e criação de novas abordagens acerca da Amazônia. A construção da investigação parte da vivência de campo, pesquisa bibliográfica e poética audiovisual, resultando na produção do vídeo “Bela Terra”. Ecos dos empreendimentos da norte americana Ford Motor Company em Belterra-PA e Fordlândia-PA foram analisados, de forma a questionar o desenvolvimento colonizador na região do rio Rio Tapajós, Pará.
PALAVRAS-CHAVES: Amazônia, colonização americana, Fordlândia, intervenção artística, audiovisual.
INTRODUÇÃO
O Projeto Amazônia: Visualidade gráfica, poética e imaginário, ligado ao Programa de Pós-Graduação em Design, do Núcleo de Estudos Amazônicos do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares da Universidade de Brasília (NEAz/CEAM/UnB), tem como proposta de pesquisa criar ações e projetos que estejam ligadas aos campos da comunicação, arte e design. Tendo isso em vista, um dos objetivos é estudar e analisar a linguagem e suas representações sígnicas na constituição da identidade cultural dos povos que residem na Amazônia e demais regiões conflitantes.
A pesquisa tem na vivência com comunidades ribeirinhas do Rio Tapajós (PA) o recorte inicial de investigação. Inserido nas Artes e Ciências Sociais, este projeto pretende obter da pesquisa de campo e demais estudos, ferramentas fundamentais na análise do comportamento, dos costumes, religiosidade, representações visuais e saberes dos mais diversos povos que integram a Amazônia.
O presente trabalho é um subproduto da quarta expedição do Projeto Amazônia e da Vivência Amazônica 2017, promovida pelo NEAz. Na ocasião, por meio de uma construção coletiva e colaborativa, 40 pessoas, dentre estudantes e professores, realizaram uma série de ações de formação e arrecadação de recursos para viabilizar uma aproximação com a realidade amazônica, contribuindo para o intercâmbio científico e cultural através de vivências e trocas de experiências no âmbito da pesquisa e extensão.
Em um ônibus que partiu de Brasília e que cruzou grande parte da Rodovia Transamazônica (BR-230), os acadêmicos de diferentes áreas do conhecimento passaram por Araguaína-TO, Marabá-PA, Brasil Novo-PA, Medicilândia-PA, Santarém-PA, Itaituba-PA, Serra do Cachimbo-PA e Cuiabá-MT. Dessa forma, possibilitando o contato com práticas indígenas, quilombolas, político governamentais, acadêmicas, agroecológicas e de educação do campo.
A passagem por Santarém-PA, especialmente pela Universidade do Oeste do Pará (Ufopa), foi um fator preponderante para o retorno do Projeto Amazônia a Terra Indígena Bragança/Marituba, localizada em uma área sobreposta a Floresta Nacional do Tapajós e que conta com cerca de 50 famílias distribuídas nas duas aldeias. Além disso, as comunidades ribeirinhas de Nazaré e do Lago do Marai também estão situadas nessa região da Flona e compartilham, junto ao Povo Munduruku, de semelhantes problemas de isolamento espacial, educacional, político, cultural e comunicacional na região (SANTOS, 2018).
O caminho por terra saindo da comunidade de Bragança em direção a Alter do Chão-PA nos levou a passar por Belterra-PA na tarde de sexta-feira do dia 8 de dezembro de 2017. Belterra-PA, ou Bela Terra, conhecida por seu solo fértil de 'Terra Preta' consequência da ocupação indígena, desperta curiosidade por sua arquitetura e resquícios dos desdobramentos de uma colonização americana pautada na exploração dos recursos naturais brasileiros e numa política favorável à ocupação colonizadora.
Belterra surge num contexto de falência de Fordlândia, cidade americana criada em uma área de um milhão de hectares, concedida pelo governo do Pará, situada às margens do Rio Tapajós, com o objetivo de abastecer a Ford Motor Company com borracha de látex, fruto das seringueiras, para confecção de pneus para automóveis. Henry Ford, criador da companhia, é considerado um dos empresários que levaram os EUA à posição de potência mundial no início do século XX. Ele revolucionou a indústria norte-americana e mundial em vários aspectos (DUARTE JR., 2015).
A região da Amazônia, especialmente as cidades desenvolvidas próximo ao encontro entre os rios Amazonas e Tapajós, vivia um período de estagnação econômica pós-ciclo da borracha, que vai da década de 1910 a meados da década de 1940. E, mesmo com iniciativas como o Plano da Borracha, em 1912, que apresentava facilidades de isenção fiscal, acesso às terras devolutas do Estado e aos recursos naturais para o capital internacional, não foram suficientes para assegurar o sucesso desejado com o plano (MAHAR, 1978).
A seringueira (Hevea brasiliensis) é uma árvore originária da Amazônia e que, devido a seu valor e grande interesse internacional, transformou a vida econômica e urbana de Manaus e Belém durante o Primeiro Ciclo da Borracha, também conhecido como Belle Époque Amazônica. Belém e Manaus vivenciaram avanços nas áreas de saneamento e transportes urbanos (por meio de bondes elétricos), linhas regulares de navios diretamente para a Europa, e se tornaram dois dos principais centros de negócio de diamantes no mundo no início do século XX, rivalizando diretamente com Londres e Nova Iorque (DUARTE JR., 2015).
Em mais um processo de exploração e uso indevido dos recursos naturais brasileiros sem a compreensão nacional, o britânico Henry Wickham, entre 1869 e 1872, viajou por toda a região do rio Tapajós e conseguiu enviar para o Reino Unido cerca 70 mil sementes de seringueiras para estudo e aclimatação (DUARTE JR., 2015). Fato que possibilitou a plantação das sementes em colônias britânicas no sudeste asiático, que passou a oferecer borracha natural em escala crescente no mercado internacional e a preços menores que o Brasil, levando à estagnação econômica da região amazônica.
Henry Ford, insatisfeito com a dependência da borracha britânica, decide criar sua própria plantação de seringueira. Após acordo com o governo brasileiro que possibilita isenção total de tarifas de exportação e importação, direito de exploração de todos os recursos existentes no terreno, construção de qualquer obra de engenharia ao longo do rio Tapajós sem consulta aos brasileiros, abertura de bancos e representações comerciais em seu terreno, constituição de força policial etc., o antigo terreno conhecido como Boa Vista deu lugar a Fordlândia.
Dois navios foram enviados dos EUA diretamente para Fordlândia. Os porões dos navios continham tudo o que se podia imaginar para a construção de uma cidade: tratores, geradores, enxadas, pás, machados, máquinas para estradas, britadeiras, equipamentos hospitalares e para a produção de concreto, material de escritório, roupas de trabalho, comida, uma fábrica de gelo etc. (DUARTE JR., 2015).
Segundo Grandin (2010, p. 18), na época, o jornal Washington Post e a Revista Time noticiaram que o projeto de industrializar a selva proposto por Henry Ford era uma possibilidade do homem branco levar a magia da civilização “para o mundo selvagem”. No final de 1930, Fordlândia já estava estruturada como uma cidade norte americana na Amazônia, com casas com jardins, escola bilíngue, hospital de referência nacional, ferrovia, estação de captação, tratamento da água do rio Tapajós etc.
Ascensão e queda do projeto de desenvolvimento da Amazônia
De acordo com Sena (2008), Fordlândia provocou grandes alterações na cultura local, alterando relações de trabalho e da vida de seus habitantes. A década de 1930, durante a vigência do Estado Novo no Brasil, é marcada pelo avanço da acumulação capitalista; redefinição do papel econômico do Estado; implantação de um núcleo industrial de base; e a afirmação do modelo urbano-industrial enquanto eixo predominante da economia brasileira (MENDONÇA, 1990).
A forma desrespeitosa como os americanos se dirigiam aos trabalhadores brasileiros, tratando-os de maneira discriminatória, com apelidos pejorativos usualmente relacionados à cor da pele, menor estatura e eventuais deficiências físicas (DUARTE JR., 2015) e o desconhecimento sobre clima, solo, rios, cultivo de seringueiras e sobre a vida social na região (PEREIRA, 2016) foram fatores cruciais para o fracasso do projeto.
Independentemente dos altos investimentos, o projeto de Fordlândia fracassou em 1934 devido à má escolha da localização do empreendimento e do “mal das folhas”, doença que atacou os seringais e destruiu praticamente toda a plantação naquele momento (SENA, 2008), sem falar da forma acidentada do terreno para o desenvolvimento da seringueira, do distanciamento do projeto em relação ao porto de Santarém (principal cidade naquela região e lugar de concentração da mão de obra disponível) e da dificuldade de navegação dos navios maiores durante o período da estiagem (CRULS, 1939).
Conforme o estudo de Grandin (2010), mesmo com a escassez de recursos humanos para as plantações, a mão de obra indígena era descartada, pois os mesmo eram considerados “não domesticados”, “inaptos ao trabalho”, “preguiçosos”, “indisciplinados” e “traiçoeiros” pelos dirigentes. Após ter investido US$ 7 milhões de dólares e seis anos de trabalho em Fordlândia, especialistas ligados a multinacional americana Ford, optaram, em 1934, pelo deslocamento do empreendimento de borracha rumo a cidade de Belterra-PA, onde se desenvolveria a nova plantação e construção de uma nova cidade semelhante a Fordlândia (GRANDIN, 2010).
Segundo Gramsci (1988), em estudo sobre o fordismo, sistema organizacional e industrial implementado por Henry Ford, um novo tipo de humano exigido pela racionalidade econômica estava em construção, adequando-se às novas formas de trabalho e produção. Esse perfil foi estabelecido em Belterra-PA através da combinação de mecanismos de coerção e consentimento.
Belterra-PA viu a hierarquização humana sendo representada e vivenciou, na distribuição das moradias e dos indivíduos, a divisão dos espaços em Vila Americana, onde viviam os americanos que coordenava o projeto americano; Vila Mensalista, onde moravam os trabalhadores envolvidos nos cargos de chefia; Vila Operária, onde moravam os trabalhadores com alguma especialização, como mecânicos; Vila Viveiros I e II, onde moravam aqueles que cuidavam das mudas de seringueiras; e Vila 129, onde viviam os trabalhadores que desenvolviam as atividades braçais no projeto. Existiam ainda mais dois espaços sociofuncionais: a Vila Timbó, destinada aos enfermeiros funcionários do Hospital Henry Ford, e a Vila Pequiá, onde moravam os poucos seringueiros e operários que não viviam em cabanas (PEREIRA, 2016).
Para fins analíticos, podemos apresentar os elementos estruturantes dessa experiência em Belterra: 1) um conjunto de procedimentos, usos e apropriação do território alheio à gente do lugar, sob a racionalidade do lucro e do uso da técnica mais sofisticada que, na prática, representou um processo de expropriação da natureza das famílias que lá moravam antes da chegada da empresa de Henry Ford; 2) a destruição ou o desarranjo dos modos de vida preexistentes no lugar, com o recrutamento de sua população na área rural e seu deslocamento para a cidade recém-criada para atender às necessidades de mão de obra da Companhia, sendo que o seu ajustamento ao novo modo de vida urbano se deu por meio de um processo de (re)socialização na cidade, que visava constituir o novo tipo humano, disciplinado e hierarquizado, necessário à atividade industrial; 3) o uso predatório da natureza, causado principalmente pelo grande desmatamento e pelas queimadas; 4) a enunciação dos estereótipos e a sociabilidade de evitação por parte dos americanos, pré-figuradas e estimuladas pelo desenho hierarquizado das moradias na cidade, que expressavam a premissa de industrializar a selva, levando até ela a civilização do homem branco; 5) um tipo de urbanização que ainda não havia sido experimentado na região e que contrastou com a pobreza e precariedade dos serviços existentes, no período, nas cidades da Amazônia. (PEREIRA, 2016)
Para Matos Pereira (2013), os relatos indicam que a borracha de Belterra e Fordlândia não abasteceu o mercado norte-americano, mas fala-se que, de lá, eles levaram ouro, prata, madeira e outros minérios. Belterra foi repatriada pelo governo brasileiro em 1945, integrando o município de Santarém após desistência da Ford Motor Company, tendo em vista o surgimento da borracha sintética (derivada do petróleo) e o baixo custo da borracha no continente asiático.
As cidades-empresa de Fordlândia e Belterra, do ponto de vista empírico, significaram a materialização da “fala do desenvolvimento” e do projeto de modernização capitalista proposto pelo presidente Getúlio Vargas para o Brasil (MATOS PEREIRA, 2013). Estudos e produções comunicacionais são necessários para se entender a importância do patrimônio cultural deixado pelos americanos, de forma a promover a localidade.
A arquitetura das casas, organização espacial da cidade e as típicas caixas d’águas americanas são alguns dos rastros mais relevantes e que mantêm a memória de Belterra e Fordlândia viva, muitas delas consideradas patrimônio histórico tombado. No caso de Fordlândia, por exemplo, a caixa d’água se tornou referência para os navegantes no rio Tapajós (DUARTE JR., 2015).
A ideia de progresso provindo pela ocupação americana está presente na bandeira oficial de Belterra, que carrega o emblema “Livre para o Progresso”. Assim como também está na representação de uma seringueira, de frutos, do Rio Tapajós, dos galpões americanos e da caixa d'água, que se tornou uma espécie de monumento. A análise e questionamentos acerca da arquitetura e desenho são objetos de obras da dupla de fotógrafos de vanguarda alemã Bernd and Hilla Becher, que apresentam estruturas arquitetônicas industriais (silos, caixas d’águas, caldeiras etc.), denotando uma estética modelada a partir do próprio pragmatismo do objeto e de sua função reprodutiva do capital (COSTA, 2010).
A dominação e gestão norte americana incluía a propaganda, tendo em vista o cenário político da época de competição com a antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e a estratégia de manter a América do Sul sob influência dos Estados Unidos da América. Fatos que promoveram, em 1943, a produção de um documentário co-produzido entre o Office of the Coordinator of Inter-American Affairs (Agência do Coordenador de Assuntos Inter-Americanos) e o Estúdio de Walt Disney. O documentário fazia parte de um corpus de filmes comerciais e documentários dedicados a promover a chamada Política da Boa Vizinhança na América Latina durante a Segunda Guerra Mundial (WEINSTEIN, 2007).
Barbara Weinstein (2007) atenta que o documentário, precocemente, utiliza-se de elementos do que se tornaria a “teoria da modernização”, baseada na noção de que todas as pessoas aspiram a um modo de vida mais moderno, e que só precisam da tecnologia e do capital apropriados para repetir a trajetória das sociedades mais “avançadas”.
Mais especificamente, o documentário indica repetidas vezes que a aspiração humana “universal” para o progresso e para uma vida melhor é atributo dos habitantes da Amazônia; sua potencialidade para a modernidade e o progresso é definida como “adormecida,” dormente, mas latente e inerente – quer dizer, já presente na sua cultura e até no seu cotidiano. Para despertar e realizar essa potencialidade plenamente, só faltaria o estímulo do capital e da tecnologia estrangeiros. (WEINSTEIN, 2007)
Vemos que constantemente se é colocada a ideia de desenvolvimento e progresso, sempre associado aos símbolos culturais provindos de países considerados desenvolvidos. No caso aqui analisado, do próprio Estados Unidos da América. Essa concepção desrespeita os conhecimentos tradicionais, a medida que impõe um modelo desenvolvimentista pautado na perspectiva do estrangeiro. Glauber Rocha (1965), em seu manifesto sobre uma estética da fome, afirma que “a América Latina permanece colônia e o que diferencia o colonialismo de ontem do atual é apenas a forma mais aprimorada do colonizador: e além dos colonizadores de fato, as formas sutis daqueles que também sobre nós armam futuros botes. (...)”.
Diversas produções audiovisuais foram criadas na tentativa de retratar os atrativos e a história de Belterra e, principalmente, de Fordlândia. A exemplo do documentário “Fordlândia, um império perdido na Amazônia (2008)”, dirigido por Marinho Andrade e Daniel Augusto e que entrevista sobreviventes da época em que a cidade empresa ainda estava em funcionamento.
A obra Bela Terra
A partir da experiência empírica e de campo em Belterra-PA, intrigado com a arquitetura e história ali presente durante minha breve passagem, e também tendo em vista a condição artística possibilitada pela captação e produção de imagens videográficas com câmeras e computadores, foi produzido um vídeo que documenta as mensagens compartilhadas pela cidade e, experimenta, na tentativa de exprimir um pouco das camadas que os olhos e a mente foram sensíveis ao captar. Obra esta que pode ser conferida em https://goo.gl/dHqUan.
Autores como Benjamin (1994) e Canclini (1998) colocam a cidade como um espaço de passagem, onde se atravessam e se acumulam camadas (sons e ruídos de todo tipo, monumentos, pichações, cartazes publicitários, vitrines, painéis eletrônicos, tapumes...). E Doreen Massey (2008), em sua perspectiva de politizar o pensamento sobre o espaço, afirma que vídeos fazem notar as diferentes trajetórias que configuram cada lugar, além de apresentá-las como trajetórias em aberto, em constante devir, vinculadas e desvinculadas a um só tempo do contexto global atual.
Uma câmera na mão e o olhar curioso de quem estava na Amazônia, acabando por deparar-se com uma cidade construída sobre a perspectiva norte americana, fez com que as inquietações ali adquiridas, numa fração de tudo o que estava acontecendo, fossem traduzidas em um produto audiovisual que explora a linguagem que me levou a um estado interativo, de natureza que convida ao jogo, a manipulação, a transformação, ao ensaio e à mudança, a experimentação e à invenção de outras regras estéticas (PLAZA, 1998).
O vídeo, como umas das principais instâncias criadoras da arte (MACHADO, 1997), me possibilitou a criação da obra “Bela Terra”, que traz imagens de um plano sequencial de umas das principais ruas da antiga Vila Americana de Belterra, mostrando como esse patrimônio segue uma ordem rumo a sua superação e adoção de novos padrões. Porém, ao mesmo tempo, reforça a imagem da caixa d’água que marcou os navegantes do Tapajós e é fragmentado da história conflituosa entre americanos e a Amazônia brasileira.
Publicidades do período de maior influência norte americana, ainda presentes em Belterra, foram capturadas durante esta pesquisa e trazem a marca da Ford Motor Company com o texto “A gente tem estrada”. A ideia de desenvolvimento atrelada ao automóvel e ao asfalto é desconstruída no próprio retrato do outdoor relicário, sem valor e possuinte da aura de um projeto fracassado, mas determinante para a dinâmica ali desenvolvida cotidianamente. Lógica também adotada para a construção da Transamazônica (BR 230), com entorno destinado a ser ocupado, a ser "civilizado”, uma terra “sem donos”, esperando por braços que a trabalhassem (LOMBARDI, 2009).
O vídeo segue e os seus 2min04s de duração são marcados pela sonoridade instrumental do hino dos Estados Unidos (The Star-Spangled Banner), de forma a expor frutos do empreendimento de influência norte americana na América Latina. Expor um memorial que além de brasileiro é também norte americano, exemplo do que o poder do capital pode fazer a partir da arrogância e confiança em Deus.
CONCLUSÃO
Tendo em vista a ideia de “subdesenvolvimento” e a dimensão continental da Amazônia, analisar casos como os de Belterra-PA, em um vídeo como “Bela Terra” (https://goo.gl/dHqUan), possibilita um melhor entendimento da História brasileira e de sua posição num contexto global de exploração. Poucos são os brasileiros que têm o privilégio de conhecer e mergulhar na imensidão de um país tão rico e controverso.
A importância do Rio Tapajós e das comunidades que o cercam são imensuráveis. Infelizmente, na Amazônia, a expansão do agronegócio tem destruído e convertido a floresta em áreas de produção de grãos para atender um mercado global. O mercado de terras se aguça na medida em que o avanço da soja na Amazônia discursado pela burguesia agrária e seus aliados é o motor de tal “desenvolvimento” econômico (CONCEIÇÃO, 2017).
A Transamazônica, assim como Belterra-PA e Fordlândia, são um exemplo de como o pseudo-progresso pode ser fatal para as comunidades tradicionais. A extensão universitária, comunicação e educação são essenciais para, a partir de reflexões sobre as condições com as quais estamos interligados, a ação transgressora e de mudança possa se concretizar.
Resta-nos refletir sobre qual o modelo de desenvolvimento que queremos?
REFERÊNCIAS
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